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Mensagem: Sobre um Time de Futebol Dizia o meu Professor de História e Ciências Naturais, Pedro Martins de Santana: a História é a mestra da vida. Reitero dizendo que não somente mestra, todavia aflora a saudade e a vontade de registro para perpetuar os fatos. E pode morrer, adulterar-se ou sofrer acentuado resumo, se não buscarmos a realidade no mais recôndito da memória. Um setor da minha vida na convivência com outras tantas crianças, na mais alegre, saudosa, salutar e vivificante das recordações. Carece de imortalizar. Eu tinha oito anos. Mudei com meus pais, irmãos e irmãs, dos fins da Rua Camilo Prates, na Vila Operária, para uma casa que existiu no lugar onde é hoje o Colégio Indyu, na Rua João Pinheiro. Corria o ano de 1947. Naquele setor e imediações, conheci outras crianças com mais e mais brincadeiras. Embora a minha Montes Claros fosse pequena, sua cultura e seus costumes diversificavam de um setor para outro. Sempre uma cidade de convergência. Portanto, Montes Claros (terra natal minha), no esplendor ainda do seu romantismo, formamos eu e meus novos amigos das proximidades da nova morada, instintivamente, um time de futebol de crianças de pés descalços. Sapatos só em outros momentos. Seis anos depois, cada um tomando seu novo rumo no futebol, dispensamo-nos para times de pés calçados. Até então, treinávamos na Rua João Pinheiro, entre as Ruas Tiradentes e Januária, e entre esta e a Rua General Carneiro. Também na Rua Mangabeira, hoje Coração de Jesus, atrás do Indyu, ou na pracinha, hoje Capitão Enéas. Em todas as áreas citadas e as que virão era chão, e por vezes machucava nossos pés. Não creio que em Montes Claros, na sua história futebolística, um grupo coeso de crianças tenha convivido com a bola nos pés tantos anos juntos, seis anos. Eu sou um deles imortalizados. Tínhamos três duplas de irmãos no plantel, e isto é fantástico. São eles: João Carlos dos Santos e Marcos, Tuca e Carlos; Osvaldo e Osmar (os Turíbulos), José Bispo e Bonga. Mais um motivo para nossa grandeza em valor esportivo. Não havia tempo ruim para este grupo específico. Com os pés no chão, na poeira, na lama, no cascalho e até pisando no estrume das boiadas. É que as boiadas, muitas de grande extensão, passavam todos os dias na Rua Mangabeira, rumo ao Bairro Alto Severo, hoje Santo Expedito. Não vou mencionar os nomes de todas as crianças que conviviam (algumas não se integrariam naquele setor). Eram todos muito simpáticos e participantes das brincadeiras, tais como: pegador, jogo de bola de gude, araras (pipas), finca, Brasil e Espanha, porta-bandeira, chicotinho queimado, tocar pneus, tocadeiras, cavalinhos de pau, figurinhas, etc. E as andorinhas? A resposta virá. Quero ser restrito aos nomes mais diretamente ligados ao futebol. O grupo que não se apegava às proximidades de suas casas, e saia para longe para jogar contra. Correndo riscos nos campos ou campinhos adversários, enfrentando as adversidades e as más ocasiões. Eram eles: Tucá e seu irmão Carlos, Ilder, João Carlos e seu irmão Marcos, Jomar Macedo, Uriel, Valderi, Osvaldo e Osmar seu irmão, Lúcio (primo de João e Marcos), Vicente Peixoto, José Bispo e Bonga seu irmão. Nossos adversários jamais retribuíam as nossas visitas. Deslocávamos mais nas tardes dos dias comuns, e nas manhãs dos domingos, feriados e dias santos. Jogos contra aconteciam também em dias de semana, como exemplo na Praça da Santa Casa (Honorato Alves), contra os meninos das imediações de lá. Na Rua Irmã Beata havia um campinho onde jogávamos. Na Praça da Santa Casa (Honorato Alves), a bola, durante os jogos, quebrava as telhas do muro do quintal do Sr. Cândido Simões Canela. Um dos meninos que também jogava, e contra nós, era o nosso amigo Reinilson Canela, também responsável pela quebradeira, pela bola, das telhas do seu muro, involuntariamente. De propósito, nem ele e nem ninguém chutava a bola nas telhas. Tudo era festa, pois os cacos serviam par a guerra depois das partidas. Jogavam cacos e nós os devolvíamos Outro campinho, chamado impresso, ficava entre a via férrea e o início da Rua dos Ferroviários. Bem próximo ao galpão das locomotivas havia um campinho no qual jogávamos na maioria das vezes contra os meninos da Rua São Francisco, como referência. Num terreno margeando com a atual Rua Professora Geni Leite, pertencente ao Sr. Pedro Simões Canela, jogavam também Antônio e Armando, filhos dele. Jogavam contra nós. Havia um campo onde hoje é a Rua 1º Centenário e ao lado, outro que o time Cassimiro de Abreu patrolou, mas não murou. Jogamos nos dois. Em frente ao IPSEMG, no fundo do quintal da casa de frente, havia uma casa e no fundo do seu quintal um campinho, onde um dia fomos até fotografados por Joãozinho Mangabeira, em 1948. Na rua João Pinheiro, chegamos a usar dois lotes vagos: um no atual nº 383 e outro no 523. Usamos uma outra área, na Rua Buenos Aires, entre as ruas João pinheiro e Dr. Veloso. Na área da atual Praça Capitão Enéas, mesmo com terreno irregular, jogamos muito. Lá, a bola tanto caia no alpendre como no quintal de Dona Julieta. Casa que ainda existe. E ela não deixava de ter certos prejuízos, que a obrigavam a prender a bola para servir como lição. Jamais nos humilhou e não demorava muito para nos devolvê-la. Quando entre nós, naquela mesma área, começava uma confusão, o Sr. Santos Guimarães, lá mesmo da manilha onde se assentava (na porta de sua casa) para nos ver jogando, ou sua esposa Dona Rosalina, davam um grito e a confusão acabava depressa. Sem nos ofender. Ainda lá, Dona Edite na sua casa nos prestava carinhoso trabalho. Ela pintou de azul a metade das camisetas brancas que compramos, assim formávamos os jogos com dois times. E para completar a admiração que nos tinha, de vez em quando, terminadas as partidas, nos dava doce de coro ralado em calda. Ela era mãe do Padre Zuba. Contrastando às citadas pessoas do mais alto grau ou nível social humano, para nós crianças, vou narrar um acontecimento deprimente, truculento, covarde. Do lado de baixo da atual Rua Rayu Christoff, a divisa era uma cerca de arame farpado. Havia um capinzal, manga ou pasto, como queiram; pasto para animais. Justamente onde é o cruzamento da Rua Januária, que naquela época terminava na Rua Coração de Jesus; por volta de 1950, na Januária com Edmundo Dias, criou-se por si uma clareira. Passamos a fazer dela, pequena por sinal, um campinho para, às tardes, jogarmos futebol. Um dia, uma pessoa do sexo masculino, acompanhado de outro, chegou de carro pela Rua Rayo Christoff. Logo que desceu do carro, antes mesmo de passar por baixo da cerca, já estava empunhando um baita de um revólver. Tomou a direção do campinho, andando às pressas, revólver apontado para nós, e as ameaças de um palavreado ameaçador, não economizou. Foi uma correria para diversas direções, pelos fundos da manga. Eu e um outro colega, valendo-nos da altura do capim, corremos passando bem perto dele, que não nos avistou. E pudemos vê-lo e identificá-lo. Saímos na Rua Rayu Christoff, não longe do carro dele. Os outros meninos, houve quem saiu acima do frigorífico. Um dos nossos amigos que também estava jogando, de nome José (natural da cidade de Bocaiúva), sem perceber, por causa do capim alto, chocou-se com uma cerca de arame farpado, machucando-se. Livramo-nos do valentão, que se insurgiu contra crianças, umas vinte, indefesas, inocentes, sozinhas, sem nenhum pai no momento para nos defender, ninguém. Nenhum de nossos pais ficaram sabendo, não contamos. E o valentão ficou impune enquanto viveu. Por muitos e muitos anos era visto por nós, repugnante figura. Ele, de memória escura, esqueceu-se de que um dia foi criança também, e já com uma natureza daquela? Mas não deve ter corrido na frente de um cano com um tambor de balas. E nem atrás de uma bola como naquele momento (ele não tinha inteligência para raciocinar que atrás da bola e na frente do seu “revolvão” corriam pequenos benfeitores da espiritualidade esportiva). Nunca ficou sabendo que nenhum de nós seguiu o caminho da delinqüência, pois éramos atletas e os que ainda vivem são esportistas. E não portadores perversos de armas. Tudo faz crer que aquele indivíduo reverenciava algum animal, que pastava por ali ou o capim vermelho infestado de carrapatos. Eu sabia o nome dele, felizmente esqueci. Fazendo uma comparação grosseira quanto à “espiritualidade” dos personagens simpáticos citados (melhor para entender, é o que faltava nele), na frente do cano do seu trabuco em punho, em debandada que ele cruelmente provocou, correram pequeninos seres humanos superiores a ele. Infelizmente, um dos nossos, o José, se estrepou nas pontas do arame farpado, ironia espiritualmente contrastante. Voltando às pessoas de espiritualidade elevada para nos respeitar e admirar, posso citar uma Senhora que tinha o semblante acolhedor, numa postura de autenticidade esportiva, e que acompanhava nossa movimentação, jogando na Praça antiga da Santa Casa, hoje Honorato Alves. Era Dona Viola, que morava naquela Praça e do seu alpendre não nos perdia de vista. Uma doçura de pessoa. Pessoa como ela e outras tantas da época, educaram seus filhos e ainda ajudavam na educação dos filhos dos outros que aceitavam de bom grado a interferência na boa formação. Era a casa do Sr. Cândido Canela, num setor da Praça, a de D. Viola do outro, e a do Sr. Viriato Veloso mais em baixo, próximo à Santa Casa. No muro da casa do Sr. Cândido Canela e no alpendre da casa de Dona Viola, a bola provocava quebradeira. E na casa do Senhor Viriato Veloso as telhas eram quebradas pelas mangas que eram atiradas umas conta as outras em uma mangueira frondosa em frente da casa dele. A repetição de alguns nomes de pessoas é devido ao elevado respeito que a nós dedicavam por saber que nas nossas atitudes não havia propósito de destruição. Não há como relembrar apenas o futebol quando alguns fatos interessantes no momento aconteciam. Exemplificando, lá mesmo na Praça da Santa Casa, algumas vezes um caminhão cheio de canas descia a Praça rumo ao Bairro do Melo. Parávamos o jogo e cercávamos o caminhão ainda em movimento para atordoar o motorista e seu ajudante, que ficava em cima do caminhão. Este ajudante, irreverente e mau, atirava canas em nós (nunca acertava), pois que puxávamos as canas pelas frestas da carroceria. Um dia passou um carro todo fechado com tração animal subindo a Praça. A porta de traz da carroceria abriu-se, e os pães iam caindo. Paramos o jogo, que era contra os meninos daquelas bandas, e fizemos uma festa com os pães. O condutor só percebeu quando virou a Av. Afonso Pena, à esquerda. Os meninos de lá também recolheram os pães. Brincávamos até com andorinhas, às vezes parando com a bola. Isto acontecia no final e princípio de ano. As chuvas eram regulares naquela época e com elas o advento das mariposas e outros insetos, tais como as formigas que criavam asas. Era na Rua João Pinheiro, e não se sabe de que ponto da Terra elas (as andorinhas) apareciam aqui em Montes Claros. Andorinhas de bom tamanho, que davam vôos rasantes naquela rua, para pegar os insetos. Elas eram às centenas e passavam baixinho. As crianças naquela época tinham infância e fariam inveja a muita gente de hoje, se tivessem sido filmadas. Algumas vezes jogávamos com bolas de pano, feitas por nós mesmos, ou de borracha, e até de couro (chamadas de capota), cuja câmara de ar era de bico para o enchimento. Tinha uma abertura com furos lado a lado, onde era introduzida a câmara de ar vazia. Assim cheia com bomba, o bico era dobrado, amarrado e introduzido na abertura. Com uma correia fina de couro passada pelos furos, a abertura era fechada. Minha intenção foi a de imortalizar preferencialmente os meninos da elite do futebol em questão, isto é, do time já citado. Foram seis anos de companheirismo, de 1947 a 1953. Dificilmente éramos derrotados pelos adversários, fosse onde fosse, e eles quem fossem. Todas as partidas nos domínios deles que nunca nos pagavam com a retribuição de pelo menos uma visita. Não medíamos distâncias, riscos, e não sabíamos o que significava medo. Revivendo este passado de mais de sessenta anos, em nome de todos os meus colegas deste time, agradeço a todos que nos brindaram com esta leitura. Viva a lembrança daqueles colegas do futebol, concentrado neste time, que posso chamá-lo de itinerante, pela raça contra a derrota e a comprovada existência que aqui se imortalizou.Alvimar Ponciano Ribeiro
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